sábado, 31 de maio de 2008

Gosto pela Leitura

Os velhos de hoje falam muito de como os jovens não tiram a bunda do sofá. O que não deixa de ser uma verdade, levando-se em conta que esta é mais uma das grandes generalizações em que existem grandes exceções.
No meu pensar, os jovens têm mais é que colar a bunda no sofá. E acompanhado de um bom livro.
Os jovens devem reaprender a ler. E estimular as crianças a lerem mais também.
Sou daquelas chatas e certinhas. Já tentei relaxar e descansar a postura de seriedade que passo. Mas não dá. E sempre que puder, vou espalhando por aí o vício à leitura.
Leio por prazer.
Esses dias atrás até fiquei meio alterada com meu pai. Estava jantando e lendo um livro de filosofia que estou lutando contra o tempo para acabá-lo ainda antes das férias.
Ele me perguntou o que lia. Já sabendo o que iria escutar, respondi seca: "estou lendo por prazer".
Ele insistiu, e eu cedi: "filosofia". Já pensando que ele iria dizer para eu ler livros de Direito, quebrou minha expectativa, que me desgostou muito mais: "Você está ficando viciada!". Repliquei: "pelo menos é um vício bom". Parecendo querer me irritar: "Bom?! Nada em excesso é bom".
Aquele dia ele conseguiu me tirar do sério. Não briguei com ele. Mas tive vontade de dizer que só porque ele não conseguia ler o tanto que leio por puro prazer, ele não tinha o direito de atrapalhar a leitura de ninguém dizendo bobagens.
Você, neutro e parcial deve achar que é exagero meu me irritar com essas situações, e que talvez ele tenha razão quanto ao "nada em excesso é bom".
Isso me irrita, primeiro porque eu não deixo de fazer nada para passar horas lendo. Eu paro, como qualquer pessoa para ir à academia, por exemplo. E se janto lendo, é só porque é o tempo que tenho livre antes de dormir. Outra, eu praticamente engulo a comida. Ler sempre me faz comer devagar e corretamente, mastigando bem o alimento.
Vício malogro para mim são esses que infestam à indiferença das mentes já comprometidas: a bebida, o cigarro, as drogas ilícitas, o prazer da malandragem, a prática incessante de crimes, a internet e suas facilidades pornográficas, e as mentes vazias que engolem tudo que aparece na TV. Nossa juventude lê muito pouco, e se existe algo que para mim me põe à frente dela é a leitura.
Eu sou dessas que lê de tudo quando tem tempo ou um pouco de curiosidade: manual de eletrônicos; contratos de garantias que esquecemos na gaveta e só lembramos quando o produto estraga; bula de remédios; receita que vem nos jornais; as páginas amarelas da Veja; blogs de amigos; artigos científicos; poemas, letras de músicas; revistas de moda, arquitetura e arte; livros de filosofia; gramática, dicionários; ficção e meus livros da faculdade. Ufa! E mais um pouco que não lembrei.
Vício? Pode ser. Mas olhe ao seu redor. Quantas coisas não estão impressas, prontas para serem lidas? Suas maquilagens e remédios, comida embalada e água engarrafada. Estão dispejando informações em nós consumidores! E nem nos damos o trabalho de ler. Mas se acontece alguma coisa, alguma reação alérgica, a culpa é do produto! Não! A culpa é nossa por não ler. "Reações adversas", "Não consumir se...", "Contém...".
A comunidade científica briga com as grandes indústrias que não informam da origem de seus produtos, se transgênicos ou orgânicos. Fico me perguntando que diferença faz a esse grande público que não lê sequer a placa da rua antes de perguntar a rua na qual se encontra ao pobre pedestre, que se apressa a chegar em seu destino. Pouparia-lhe tempo sob o sol.
Enfim, o que estou fazendo aqui é mais um desses meus exercícios regulares de convidar as pessoas a lerem. Gostem ou não gostem das minhas ideias, só admito críticas se forem pautadas em leituras. Pode-se alegar a passividade daqueles que não dispõem de recursos para a leitura. Mas não me dirijo a este público minhas palavras. Dirijo aos que estudam em escolas particulares mesmo, que têm aulas de inglês no meio da tarde e depois aulas de tênis particular ou em turma fechada. A esses jovens que não sabem viver sem o orkut e o msn, que ainda têm medo de dizer "vou à livraria/ao sebo", frente à possibilidade de ser taxado de "nerd". Para encerrar, uma frase que um professor de matemática soltou aos alunos. Que a carapuça tenha servido para alguns: Se fosse vocês, não tiraria sarro de nerds. Amanhã você estará trabalhando para um". A frase é atribuída a Bill Gates. Não achei ela no original. Mas, para quem sentiu na garganta: artigo da veja - a redenção dos nerds.

quarta-feira, 28 de maio de 2008

Vida Inteligente



A ÁRVORE DA SERRA

- As árvores, meu filho, não têm alma!
E esta árvore me serve de empecilho...
É preciso cortá-la, pois, meu filho,
Para que eu tenha uma velhice calma!

- Meu pai, por que sua ira não se acalma?!
Não vê que em tudo existe o mesmo brilho?!
Deus pôs almas nos cedros... no junquilho...
Esta árvore, meu pai, possui minha'alma!...

- Disse - e ajoelhou-se, numa rogativa:
"Não mate a árvore, pai, para que eu viva!"
E quando a árvore, olhando a pátria serra,

Caiu aos golpes do machado bronco,
O moço triste se abraçou com o tronco
E nunca mais se levantou da terra!
Augusto dos Anjos
Nosso Calvin sempre nos botando pra pensar!

sexta-feira, 23 de maio de 2008

"A Linguagem com que os homens se comunicam"

Este post ficaria bom se o título fosse Convite ao Mundo Grande II.
Um poema de Carlos Drummond de Andrade traz consigo uma mensagem pacificamente tímida. É preciso lê-lo e relê-lo. Marilena Chauí compartilhou a interpretação deste poema em sua mais famosa obra. O poema é o “Mundo Grande”. A mensagem, farei metaforicamente um acontecimento de minha vida passar.
Antes de completar meus doze anos - idade em que me encontrava frágil, totalmente dependente de meus pais, introvertida e ingenuamente calada -, minha mãe, sem me consultar, havia pesquisado sobre uma proposta de intercâmbio.
Eu tinha 11 anos em magros dedos. Quando ela me deu a notícia de que eu faria uma viagem internacional por um mês sem meus pais, creio que toda essa magreza encarniçada em secos galhos que faziam meus dedos, quis se quebrar. Mas minha natureza sempre foi de encarar como uma boa experiência as situações que não escolho.
E acabei indo, no fim, mais animada que nunca. Destino: Linköping - Suécia.
Eis que nessa experiência internacional tive a felicidade de conhecer pessoas das culturas mais diversas: além de crianças suecas e jovens suecos, delegações de vários pontos da Europa. Como companhia nórdica, a Noruega; com todo seu glamour e até pitadas de romantismo, representantes da França; a pequena distância dos austríacos; as vozes e tradições romenas, carregadas de histórias da Transilvânia; um jovem de Israel e uma delegação do Líbano. Do outro lado do mundo, nós, brasileiros, tivemos também amigos de alto astral e humor, os Costarriquenhos; os Estados Unidos, que não exalavam um mísero aroma de arrogância, eram verdadeiramente boa companhia para se ter em intervalos; e o Canadá, com representantes que faziam meus lábios sorrirem sozinhos diante de tamanha meiguice.
Uma certeza eu tenho de tudo que me foi posto lá, em contrastes dos mais diversos. Eu era a criança mais quieta do acampamento. Mas queria fazer amigos. Não era antipática, e sabia dar belos sorrisos de boas-vindas a qualquer aproximação. Entendia tudo o que me falavam, mesmo quando nada respondia. É um comportamento comum de crianças que pensam muito, gostam de ouvir pessoas e tê-las por perto, mas são TÍMIDAS.
Do nada, um dia, as meninas da charmosa delegação Francesa vieram ter palavrinhas da gostosa fase da infância comigo. E disseram-me palavras soltas que qualquer pessoa que sabe montar quebra-cabeças de três peças era capaz de entender. Palavras que formaram uma pergunta. “Who you like”?
Digo até hoje que amizades entre meninas começam assim. E é um fato que tenho percebido ao longo dos meus anos – modestos ainda – como verídico. Meninas segredam entre si. Criam um pacto verbal do “não conte a ninguém”, e então nasce uma relação de afetividade. Logo depois dos segredos sobre os amores infanto-juvenis, vêm a congruência dos gostos, os presentinhos, as cartinhas compartilhadas.
Pareceria tudo absolutamente normal essa convivência entre duas meninas que se tornaram amigas diante de tais circunstâncias. O entretanto fica para o fato, que não pode ser esquecido, de que éramos de países diferentes. Eu, que não tinha um Inglês poderoso, mas regular, tinha uma deficiência enorme no falar em si, seja em que língua fosse. Ela, que tinha um inglês fraco, impossibilitava que nossas conversas fossem longas e demoradas, cheias de detalhes.
Fomos encaminhadas para uma host family juntas e o mais perto do inglês que chegávamos a falar uma para a outra era “good night” antes de pegarmos no sono. Durante o dia, brincávamos com a filha da família, que tinha nossa idade, e com o pai dela, que era sorridente, o típico “paizão”. E quando eu e minha companheira francesa tínhamos um tempo só para nós, ficávamos a apontar as coisas, cada uma dizendo o nome delas em sua língua. Como a origem é latina, muitas palavras batiam. E ficávamos excitadas com isso. E ríamos.
Hoje, passado então sete anos, vejo que “a linguagem com que os homens se falam” se fez, naquele dia tão evidente, não pelas palavras. Mas pelos gestos. Palavras são apenas nomes que os homens escolhem para dar às coisas. E são diferentes aqui de lá. Às vezes, oportunamente, iguais entre si. Mas quando ouço uma gargalhada divertida e delicada de uma criança, qualquer pessoa sabe que aquilo é um bom sentimento. Que a sensação da criança é boa. Quando crianças, nos países onde a norma bélica dita tudo, abaixam-se, escondem-se ou correm sem um real destino ao verem bombas rasgarem a resistência do ar em velocidade nos céus, qualquer pessoa entende que aquilo que elas sentem é medo. Em conjunto com muitos outros sentimentos. Mas principalmente medo.
As crianças fazem bem seus papéis de intérpretes reais do espetáculo da vida. E nem desconfiam do quanto são profissionais nisso. Mas ninguém lhes paga nada por isso. Ao contrário, elas crescem, sendo ensinadas por outros adultos que tão logo também deixaram sua infância para trás e esqueceram-se da verdadeira comunicação, aquela que paira nos olhos puros das crianças. Que em silêncio, mesmo estando os olhos cerrados, dizem mil frases diferentes, qualquer delas valendo, diferente das palavras que dão nomes e são a geografia e a cultura que lhes põe a validade. A verdadeira linguagem é uma constante, que nem a geografia, nem a cultura são capazes de deturpar.
Nossas crianças crescem e deixam de lado tudo que verdadeiramente tinham. E se perdem nas “ilhas”, fechadas em seus próprios mundos, onde seus valores são únicos e inquestionáveis. Um mundo pequeno, onde o “amor e o fogo” não têm espaço. E o coração não cresce. Como pode tamanha divergência? Tudo cresce: o mundo, as pessoas, as tecnologias, o conhecimento, as artes e a história. Mas seus corações são ditos estáticos. E reclamam ferrenhamente por esse direito de estaticidade.
- Ó vida futura! Quando te criaremos?

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Convite ao mundo grande

Mundo grande
Não, meu coração não é maior que o mundo.
É muito menor.
Nele não cabem nem as minhas dores.
Por isso gosto tanto de me contar.
Por isso me dispo,
por isso me grito,
por isso frequento os jornais, me exponho cruamente nas livrarias:
preciso de todos.
Sim, meu coração é muito pequeno.
Só agora vejo que nele não cabem os homens.
Os homens estão cá fora, estão na rua.
A rua é enorme. Maior, muito maior do que eu esperava.
Mas também a rua não cabe todos os homens.
A rua é menor que o mundo.
O mundo é grande.
Tu sabes como é grande o mundo.
Conheces os navios que levam petróleo e livros, carne e algodão.
Viste as diferentes cores dos homens,
as diferentes dores dos homens,
sabes como é difícil sofrer tudo isso, amontoar tudo isso
num só peito de homem...sem que ele estale.
Fecha os olhos e esquece.
Escuta a água nos vidros,
tão calma. Não anuncia nada.
Entretanto escorre nas mãos,
tão calma! Vai inundando tudo...
Renascerão as cidades submersas?
Os homens submersos - voltarão?
Meu coração não sabe.
Estúpido, ridículo e frágil é meu coração.
Só agora descubro
como é triste ignorar certas coisas.
(Na solidão de indivíduo
desaprendi a linguagem
com que homens se comunicam).
Outrora escutei os anjos,
as sonatas, os poemas, as confissões patéticas.
Nunca escutei voz de gente.
Em verdade sou muito pobre.
Outrora viajei
países imaginários, fáceis de habitar,
ilhas sem problemas, não obstante exaustivas e convocando ao suicídio.
Meus amigos foram às ilhas.
Ilhas perdem o homem.
Entretanto alguns se salvaram e
trouxeram a notícia
que o mundo, o grande mundo está crescendo todos os dias,
entre o fogo e o amor.
Então, meu coração também pode crescer.
Entre o amor e o fogo,
entre a vida e o fogo,
meu coração cresce dez metros e explode.
-ó, vida futura! Nós te criaremos.



Carlos Drummond de Andrade
Adicionais pessoais:

Eu simplesmente amo esse poema!!! Em laranja, as partes que mais gosto. A melhor interpretação que li do poema está em Convite à Filosofia - Marilena Chauí.
Depois desse poema, difícil não parar para pensar em certas coisas da nossa vida, não?

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Tempestade nossa

Como numa postagem passada já deixei transparecer, cá estou eu novamente dividindo com vocês um trecho que me fez pensar muito.

"Em certas ocasiões, o destino se assemelha a uma pequena tempestade de areia, cujo curso sempre se altera. Você procura fugir dela e orienta seus passos noutra direção. Mas então, a tempestade também muda de direção e o segue. Você muda mais uma vez o seu rumo. A tempestade faz o mesmo e o acompanha. As mudanças se repetem muitas e muitas vezes, como num balé macabro que se dança com a deusa da morte antes do alvorecer. Isso acontece porque a tempestade não é algo independente, vindo de um local distante. A tempestade é você mesmo [negrito meu]. Algo que existe em seu íntimo. Portanto, o único recurso que lhe resta é se conformar e corajosamente pôr um pé dentro dela, tapar olhos e ouvidos com firmeza a fim de evitar que se encham de areia e atravessá-la passo a passo até emergir do outro lado. [...] E você vai atravessá-la, claro. Falo da tempestade. Dessa tempestade violenta, metafísica e simbólica. Metafísica e simbólica, mas ao mesmo tempo cortante como mil navalhas, ela rasga a carne sem piedade. [...] E, quando a tempestade passar, na certa lhe será difícil entender como conseguiu atravessá-la e ainda sobreviver. Aliás, nem saberá com certeza se ela realmente passou. Uma coisa porém é certa: ao emergir do outro lado da tempestade, você já são será o mesmo quando nela entrou".
Kafka à beira-mar - Haruki Murakami

Achei interessante a forma que o autor, ainda que sem querer, nos diz para pararmos de nos fazer de vítimas. Uma chacoalhada para a vida!

domingo, 11 de maio de 2008

Exclusividade publicada

Este poema é Seu

Chega de anagramas com a palavra mãe,
Chega de usar seu nome próprio em poesia.
Chega de frases que parecem retiradas
De uma canção qualquer.
Chega de tomar emprestado verbos alheios,
Chega de símbolos e clichés.
Chega dessa homenagem geral às mães.
Quero que leia um poema
E sinta que ele é seu, somente seu.
Que ele foi escrito assim...
Com a sua imagem na minha cabeça
Pensando em você apenas.
Que ele não pertença a mais ninguém,
Que não diga nada a outrem,
Mas tudo a você.
Não quero fazer disso um poema frio.
Nem desprovido de palavras sentimentais.
Quero apenas que, você,
Ao lê-lo, rememore nossos momentos.
Eles estão nas entrelinhas destes versos!
E lembre: são esses momentos
Que fazem a verdadeira poesia.
Porque não há poema maior
Do que aquele que não é ouvido,
Nem visto nem cantado,
Mas soa e corre em sua mente...
Sem gastar sequer um verso,
Aquele que você mesma cria
Revivendo todas suas lembranças
E sonhando as novas, como mãe.

terça-feira, 6 de maio de 2008

Como andas pela terra

Nunca li nenhuma tragédia grega, a não ser curtos trechos em aulas, que meu ex-professor passava nos meus tempos de colegial.
Mas foi menos por falta de interesse do que por falta de oportunidade. Em verdade, interesse eu até tenho, e quanto à oportunidade, englobem-se todas as desculpas cotidianas: falta de tempo (para procurar), falta de lembrar (de ir atrás), falta de dinheiro (para comprar um livro) e até falta de prioridade (sim, porque há uma lista de desejos com mil itens em prioridade).
Por enquanto, só para matar essa vontade de falar um pouquinho sobre o tema, fica este post mais como uma curiosidade, que espero que também desperte em você, querido (a) leitor (a), um pouco de interesse sobre tragédias gregas ou mesmo a mitologia grega. Entretanto, que - diferente de mim - nunca dê tais desculpas esfarrapadas e vá logo atrás de um bom livro.
A única tragédia que me ocorre no momento é de Édipo - rei. Sim, é o mesmo Édipo que dá o nome ao famoso complexo de Édipo de Freud. Mas isso é outro assunto, sobre o qual eu tenho menos conhecimento ainda.
Essa peça pode ser vista sobre muitas perspectivas, de modo que põe em expressão variadas temáticas, sendo por isso considerada uma das tragédias mais perfeitas da Grécia Antiga.
Vou encurtar a história.
O rei de Tebas, Laios, recebe uma maldição: seu próprio filho o matará, e este, dormirá com sua própria mãe, esposa de Laios.
Édipo então é entregue à morte, mas acaba sendo salvo e parando nas mãos do rei de Corinto.
Édipo descobre, já adulto, sobre sua maldição e, numa tentativa de fuga, sai de Corinto para evitar tal tragédia, dirigindo-se para Tebas. Édipo, porém não sabia que o rei de Corinto não era seu verdadeiro pai. No meio do caminho, encontra um bando de mercadores e seu amo, matando-os todos.
Chegando a Tebas, Édipo decifra o enigma da esfinge, livrando a cidade de um terrível monstro. Como recompensa, recebe a mão de Jocasta, viúva do rei de Tebas, e todo o reino.
Tebas vem a ser vítima da ira dos deuses, pois o assassino de Laios continuava na cidade. Quando Édipo descobre que o amo que matara era seu próprio pai e Jocasta sua mãe, arranca seus próprios olhos e foge da cidade, exilando-se, e Jocasta suicida-se.
Para quem quiser ler o resumo, um pouco mais detalhado, recomendo este link.


Abrindo meu parêntesis.

Lembro-me muito bem de meu professor explicando tal peça dando ênfase na figura do Destino. Que era impossível dele fugir. Pois não importa com quantas linhas se escreva uma história, o fim será sempre o mesmo.
Mas até hoje, o que me chamou mais atenção foi o que li em Convite à Filosofia. É que, infelizmente, como disse, nunca tive acesso à obra na íntegra. Mas há outros personagens, só para citar, Labdácio (avô de Édipo), por exemplo.
Quando disse que a peça abrangia várias temáticas estava só introduzindo o que gostaria de dizer agora.

"Édipo", do grego, significa "pé inchado", "Laios", "pé torto" e "Labdácio", "coxo". Repararam numa coisa? Todos os nomes dos personagens referem-se a um defeito no pé ou perna. É que naquela época, com todos aqueles deuses que habitavam suas crenças, os gregos procuravam de alguma forma exprimir sua condição de mortalidade. E Sófocles o relaciona com a terra. Veja. Se nascidos da terra, eram imortais; mas se nascidos de um homem e de uma mulher, meros mortais. Por isso a dificuldade de caminhar sobre a terra. Mais acertadamente, em se relacionar com a terra (com o imortal), o que metaforiza a dificuldade em aceitar sua mortalidade. Além disso, pela própria tragédia em si, infere-se a fragilidade das leis humanas¹, em que Laios manda Édipo ser morto, Édipo acaba por matá-lo, porém, e por desposar sua própria mãe.
Sinceramente, estou para conhecer alguma peça que consiga manter tamanho entrosamento entre o plano literal e o plano metafórico.

E não sei quanto a você, mas eu nunca tive nenhuma dificuldade em aceitar essa condição de mortal, nem a mínima vontade de ser imortal. Aliás, nessas condições, como seria o nome da personagem? Fiquei curiosa... do grego: telos/teleios = perfeito e podos/podes = pé

Ah! sei lá, que viajada!Mas posso dizer, nessa metáfora, que ando muito bem pela terra, obrigada. E você?

___


¹CHAUI, Marilena. Convite à Filosofia.

quinta-feira, 1 de maio de 2008

Em busca do talento perdido

Já parou pra pensar em qual seria seu talento?
Bom, de verdade, eu não descobri o meu. Mas desde a primeira vez em que me elogiaram a escrita, passei a acreditar que era esse o meu talento: escrever. E já faz alguns bons anos que isso aconteceu.
Tudo bem, a letra deve ter melhorado, o vocabulário aguçado, a gramática quase impecável (pelo menos nas situações formais). Mas acho que em algum lugar estacionei, e não consigo lembrar onde pus esse "maldito carro da originalidade".
Tenho minhas próprias frases que gosto. Infelizmente não sei nenhuma de cabeça pra citar. Mas pode ter certeza, muita coisa que escrevo vem dos livros que leio. E serei franca, sou viciada em leitura, mas gosto de tirar vantagem disso. Gosto de dizer que já li esse e aquele livro. É, porque essa é uma das grandes sensações de se ler. Gosto de citar tal e tal autor, tal e tal frase, de reinterpretar a meu modo e aos meus ajustes a "moralzinha" por detrás da história. Gosto de perceber as pequenas críticas escondidas que os autores nem sempre se dão conta de terem passado. Gosto de contar quantos livros já li. Mas pobre dessa criatura orgulhosa. Nunca escreveu um livro sequer! Não tem sequer um poema do qual se orgulhe. Gostar até gosta - mas quantos já não deletou sem dó e remorso algum?
E os contos, então? Todos, uma bela porcaria.
As redações? Dissertações? Ai, eu sei lá! Sei as notas que tirei, porque gosto dos números - sempre tão quantitativos - mas eu sei lá o que neles escrevi. Não lembro. É possível escrever bem sem nem sequer saber qual é minha opinião?
Acho que o "carro" ficou estacionado em algum livro sobre os antigos pré-socráticos, entre os sofistas, os donos da arte, da retórica e da eloquência. Entre as célebres máximas de "o homem é a medida de todas as coisas".
Devo ter ficado tão preocupada em escrever bem que esqueci de fazer valer o que realmente penso.
E o que é que penso?
Penso que é realmente difícil escrever. Penso que o homem quis dar nome a tudo, e assim, tudo simplificar; mas que ele tem medo de usar suas palavras. Porque uma hora ele vai ver que não fez o suficiente delas.
Vai enxergar que muitas coisas não receberam nome. Quem muitas coisas diferentes têm o mesmo nome. Que tem medo de pronunciar alguns desses nomes. Exemplo: amor, morte, Deus, sorte, felicidade, responsabilidade, envelhecer, riqueza, só pra citar.
Penso que não basta conhecer palavras. Que de nada as servem se não se pronuncia o que se carrega como convicções pessoais.
Penso que não basta saber falar ou escrever bem, quando não se é bom ouvinte ou bom leitor.
Penso que, se o silêncio não diz nada, muito menos dizem as palavras que não retratam a verdade. A verdade de cada um.